19/01/2016















 
 
 
 
 
 
 




















As  Mulheres Que Habitam As Serras


 
 
 
Eu nunca saberei caminhar sobre um chão frio, rude e em brechas,
 
como caminham as mulheres destemidas das serras azuis nuas e frias,
 
com os calcanhares em lavaredas feridos, a serem enxadas e charruas.

Eu habito as estradas e as ruas lisas, pejadas de pálpebras cerradas

e bocas caladas na dor e no desamor que há nas papoilas invisíveis.

Eu nunca saberei desvendar o olhar esfíngico das mulheres que sabem

onde guardar o segredo do tempo e da lonjura do mar, que ao enterrarem

as mãos nas entranhas da terra, trazem a descoberto peixes azuis, tripas

e vísceras, corações de barro tão puro como o oiro.

Eu habito as casas de vidro e a minha vida corre estrangulada entre fios

e ponteiros de relógios, a espetarem-se-me nos olhos como facas ao meu destino.

As mulheres que habitam as serras,  pelas encostas, carregam nos braços os filhos,

os mortos, as árvores, os frutos, os bichos e sabem desviar-se dos precipícios,

das armadilhas e dos venenos e vão pelos carreiros alumiados dos mortos antigos.

Eu nunca saberei como chegar ao cume das serras, como sabem as mulheres

que as habitam, receio não saber como se caminha pelos carreiros tortos da vida

e não tenha eu a dignidade de alumiado ser pela Luz de uma morte antiga.

As mulheres que habitam as serras azuis nuas e frias, estão mais perto da lua,

do sol, do mar, dos mortos, da vida.




Fernando Pedrosa
 
 

 
























Fotografia de Fernando Pedrosa